O que é
autismo?
Entenda como é feito o diagnóstico e qual o
tratamento mais adequado para a criança que apresenta o transtorno
Por Luiza Tenente
Cada
criança é uma criança. A frase pode parecer simples, mas é vital para entender
o autismo. Se o seu filho receber o diagnóstico, não necessariamente vai
apresentar todos os sintomas já descritos por outros pacientes. Por ser um
distúrbio com diferentes níveis de comprometimento, recebe o nome de “espectro
autista” – para entender melhor, imagine um dégradé, que vai de cores muito
escuras, em que se encontram os casos mais graves, até os tons mais claros.
Apesar de os sinais do transtorno variarem, há três comprometimentos que são
considerados mais comuns. O primeiro é na interação social, ou
seja, no modo de se relacionar com outras crianças, adultos ou com o meio
ambiente. “Uma das teorias que explica esse comportamento afirma que o autista
tem dificuldade de entender o outro e de se colocar no lugar de alguém. Não
compreende sentimentos e vontades, por isso se isola”, afirma Daniel Sousa
Filho, psiquiatra da infância e da adolescência (SP).
O segundo sintoma recorrente é a dificuldade na comunicação: há
crianças que não desenvolvem a fala e outras que têm ecolalia (fala
repetitiva). Como terceiro sinal, há a questão comportamental: as
ações podem ser estereotipadas, repetitivas. Qualquer mudança na rotina passa a
ser incômoda para a criança. Imagine que a mãe sempre vá buscar o filho na
escola. Certo dia, é o avô quem vai pegá-la no colégio – e altera a rota de
sempre. Pode ser que ela, diante dessa mudança, fique agitada e grite, por
exemplo. Isso acontece porque a rotina é um “mapa” usado pelo autista para
reconhecer o mundo. Se algum traço desse caminho for alterado, a criança vai
reagir.
Sinais do transtorno variam
Vale
lembrar que, além desses sinais, há outros que podem se manifestar em algumas
pessoas com o espectro autista, não em todas, claro. Os surtos nervosos, por
exemplo, podem vir acompanhados de automutilação e agressão. Para entender
melhor, imagine que você esteja com a blusa apertada ou com muita fome, mas não
consiga falar o que sente. Se a criança tiver dificuldade na expressão verbal,
pode tentar se comunicar corporalmente e ter seu pedido atendido.
Hiper ou
hiposensibilidade também podem se manifestar de forma diferente nos cinco
sentidos da criança que se enquadra no espectro autista. Por exemplo: na
audição, ela pode se sentir incomodada em locais barulhentos ou ter afinidade
com alguns sons. No paladar, ela não tolera determinados sabores – por isso,
insiste em comer sempre os mesmos alimentos. E nos dias frios, enquanto você
usa um casaco pesado, a criança pode dispensá-lo – a hiposensibilidade tátil
faz com que ela não tenha a mesma sensação de temperatura que as demais. Quando
se machuca, talvez não sinta dor, por exemplo.
O espectro autista pode vir acompanhado de deficiência intelectual. Há casos,
no entanto, em que a criança apresenta alto funcionamento – ou seja, é capaz de
memorizar a lista telefônica inteira, mas não entende qual a utilidade dos
números, por exemplo. Na síndrome de Asperger, outro quadro do espectro, a
pessoa pode não ter problemas no desenvolvimento da linguagem. Ela se interessa
por assuntos específicos: sabe tudo sobre dinossauros ou avião e se restringe a
só a um tema.
Diagnóstico
Uma estimativa feita em 2010, cujos resultados acabaram de ser divulgados pelo
Centro de Controle e Prevenção de Doenças, nos Estados Unidos, mostrou que 1 em
cada 68 crianças são diagnosticadas com autismo no país - 30% a mais do que em
2008. No entanto, o diagnóstico não é tão simples assim. Isso porque não há um
exame específico que indique o transtorno – a avaliação deve ser clínica e
feita por uma equipe multidisciplinar, formada por psicólogo, terapeuta
ocupacional e fonoaudiólogo. É comum, ainda, que os sintomas sejam confundidos
com surdez (já que a criança não responde aos estímulos), deficiência
intelectual e problemas de linguagem.
Por isso, mediante qualquer desconfiança sobre desenvolvimento do seu filho,
procure um especialista. “Quanto mais precoce começar as intervenções, melhor o
prognóstico. É importante procurar as terapias adequadas o quanto antes, porque
o sistema nervoso poderá responder aos estímulos rapidamente”, explica o
neurologista infantil Antônio Carlos de Faria, do Hospital Pequeno Príncipe
(PR).
É claro
que os sinais ficarão mais nítidos após os 3 anos, mas alguns indicativos desde
bebê podem servir como alerta, como a criança ficar parada no berço, sem reagir
aos estímulos, e evitar o contato visual. Antes do primeiro ano de vida, está
sempre irritada – você o amamenta ou conversa com ela, mas continua agitada.
Por volta dos 8 meses, o bebê não interage com o meio ambiente: vê um cachorro
ou gato na rua e fica indiferente. Sabe aquela brincadeira em que a mãe se
esconde e diz “achou!”? O bebê não esboça nenhuma reação. Na hora de brincar é
comum que crianças autistas se interessem apenas por uma parte do brinquedo -
elas podem ficar girando a roda de um carrinho por um tempo prolongado, em vez
de arrastá-lo.
Há casos, ainda, em que há regressão: a criança se desenvolve bem até 1 ano e
meio. Depois dessa idade, para de sorrir ou de se comunicar, por exemplo.
Tratamento
Ainda não há um medicamento específico para o autismo. De 0 a 2 anos, a criança
deve ser acompanhada por um fonoaudiólogo para que ele ajude-a a desenvolver a
linguagem não-verbal. A estimulação pode ser feita com brincadeiras e jogos,
contação de histórias e conversa. Conhecer o novo também é importante: o
especialista apresenta uma maçã para que ela toque na fruta, conheça sua
textura e seu cheiro. Aos poucos, ela pode aprender a entender a expressão
facial dos outros. A linguagem verbal (como a fala) virá depois. As terapias
ocupacional e comportamental também são relevantes no tratamento, para que o
cérebro passe a perceber os estímulos sensoriais. “Esse tipo de intervenção
precoce pode evitar o comportamento repetitivo, por exemplo”, afirma o neurologista.
Não há uma regra para todas as crianças. A equipe multidisciplinar decidirá
qual o acompanhamento pedagógico e terapêutico mais indicado e vai discutir
sobre a educação delas, junto com os pais. “Cada caso é um caso. Em geral,
quando se tem a comunicação verbal desenvolvida, ir para a escola regular é uma
ótima opção. Mas, se a pessoa for agressiva e tiver deficiência intelectual
grave, a escola especial pode ser mais indicada”, afirma o psiquiatra Daniel.
Portanto, é essencial respeitar a individualidade delas. Mas é importante
saber: nenhuma instituição de ensino, pública ou privada, pode recusar a
matrícula.
E não são só os meninos e meninas que devem ser acompanhados por especialistas.
Receber o diagnóstico e acompanhar o ritmo do tratamento pode ser desgastante
para a família. Por isso, os pais podem ser tratados e orientados por um
psicólogo, que tentará diminuir a ansiedade e o estresse. Como costumam se
dedicar ao extremo ao filho com autismo, o irmão pode se sentir preterido. Não
se culpe, caso isso ocorra. O terapeuta conseguirá sugerir uma solução para que
todos se sintam amados – como realmente são!
Diante do
diagnóstico, é comum que alguns pais da criança procurem tratamentos
alternativos, que não têm comprovação científica, para amenizar os sintomas. Um
estudo publicado no Journal of Developmental & Behaviour Pediatrics analisou
600 crianças, de 2 a 5 anos – sendo 453 com autismo e 125 com problemas de
desenvolvimento. Os cientistas descobriram que 40% delas usavam remédios
homeopáticos, melatonina ou terapias complementares, como meditação ou ioga -
10% a mais do que as crianças sem o transtorno ou outra dificuldade no
desenvolvimento.
Isso é
prejudicial? “Não há problema em tentar, apesar de não haver a certeza na
melhora do quadro. Depende da reação de cada criança: para algumas, certas
terapias funcionam”, explica Alysson Muotri, biólogo brasileiro que pesquisa a
cura do autismo na Universidade da Califórnia (EUA).
Causa e cura
A causa do autismo ainda é estudada pelos cientistas. Muitos genes que indicam
o transtorno já foram identificados – mas ainda não podem ser detectados por
exames que façam o diagnóstico. “O que sabemos, atualmente, é que há uma
mistura entre influências genéticas e ambientais”, diz o psiquiatra. Infecções pós-parto,
tumores, causas endocrinológicas e metabólicas já foram associadas à causa do
autismo – mas ainda são especulações.
Recentemente, mais uma hipótese foi levantada pelos cientistas da Universidade
da Califórnia, em San Diego (EUA), em estudo publicado no periódico New
England Journal of Medicine. Eles exploraram a arquitetura física do córtex
humano (camada superficial do cérebro) de 11 crianças com autismo e 11 sem o
transtorno, na faixa etária de 2 a 15 anos. Ao examinar essa parte do cérebro,
perceberam que as crianças autistas tinham falhas justamente em áreas que
são responsáveis por funções comprometidas pelo transtorno – como comunicação e
interpretação social.
A desorganização foi notada em 10 dos 11 pacientes com autismo e apenas em 1 dos
11 sem o transtorno. “Pelo número pequeno de cérebros analisados, o estudo é
considerado exploratório. Mas, aparentemente, a maioria das falhas foi
originada durante a gestação, durante a migração das células que formariam as
camadas do córtex”, explica Muotri. Ainda não se sabe qual é a causa dessa
falha que acontece no segundo trimestre de gestação, quando a estrutura é
formada. Especialistas acreditam que possa ser decorrência do ambiente uterino,
do código genético ou uma mistura de ambos os fatores.
Os estudos que tentam descobrir a cura do autismo, dirigidos por Muotri,
representam a esperança para as famílias. O biólogo usa uma técnica que
transforma células de pessoas adultas em células-tronco embrionárias, ou seja,
que ainda não são especializadas. Depois disso, é possível fazê-las se
desenvolverem novamente e diferenciá-las em células cerebrais. Como elas
tiveram origem em um indivíduo que já estava diagnosticado com um problema, é
possível simular no laboratório o funcionamento dos neurônios daquele paciente
em comparação com uma pessoa sem o transtorno.
A partir dessas comparações, já se conseguiu identificar uma série de
diferenças na estrutura dos neurônios e como essas células respondem em
conjunto (o que ajuda a entender como funciona o cérebro desses pacientes). A
maior parte das pesquisas está sendo feita com portadores da síndrome de Rett,
que também faz parte do espectro autista.
Muotri reforça que o estudo exige cuidado. “Nos próximos dois anos, iniciaremos
a fase prática da pesquisa. Começaremos testando o tratamento em adultos que
não sejam autistas, para analisar os possíveis efeitos dele”, conta.
O autismo leve pode ser diagnosticado
em qualquer fase da vida e não tem cura, mas ele geralmente é diagnosticado na
infância quando a criança apresenta algumas características do autismo,
que podem ser observadas pelos familiares ou professores, por exemplo.
Os primeiros sintomas do autismo leve
podem ser observados quando a criança, entre os 3 e 5 anos de idade, já
apresenta dificuldades no relacionamento, na fala e na interação com os outros.
Sintomas e
características do autismo leve
Os sintomas e características do
autismo leve podem abranger uma destas 3 áreas:
·
Problemas na comunicação, como não conseguir falar
corretamente, dar uso indevido às palavras, não saber expressar-se utilizando
palavras;
·
Dificuldade na socialização, como dificuldade em ter amigos,
em iniciar ou manter uma conversa, olhar nos olhos;
·
Alterações de comportamento, como padrão repetitivo de
movimentos e fixação por objetos.
·
Algumas características do autismo
que podem ajudar no seu diagnóstico são:
·
Relacionamento interpessoal afetado;
·
Riso inapropriado;
·
Não olhar nos olhos;
·
Frieza emocional;
·
Poucas demonstrações de dor;
·
Gostar de brincar sempre com o mesmo brinquedo ou objeto;
·
Dificuldade em focar-se numa tarefa simples e concretizá-la;
·
Prefere ficar só do que brincar com outras crianças;
·
Aparentemente não ter medo nenhum de situações perigosas;
·
Ficar repetindo palavras ou frase em locais inapropriados;
·
Não responde quando é chamado pelo nome como se fosse surdo;
·
Acessos de raiva;
·
Dificuldade em expressar seus sentimentos com fala ou gestos.
Os autistas leves geralmente são
muito inteligentes e extremamente sensíveis a mudanças inesperadas. O
diagnóstico do autismo leve pode ser feito pelo psiquiatra em qualquer fase da
vida do indivíduo, mas geralmente ocorre na infância.